A POLÍTICA PÚBLICA E A INICIATIVA PRIVADA PARA COMPOR CONFLITOS EM BENEFÍCIO AOS CONSUMIDORES
A POLÍTICA PÚBLICA E A INICIATIVA PRIVADA PARA COMPOR CONFLITOS EM BENEFÍCIO AOS CONSUMIDORES
Julia da Costa Ferreira
RESUMO
O presente estudo terá como fio condutor a promoção de meios de composição de conflitos em rede, utilizados pela iniciativa privada, bem como por meio de políticas públicas, com o objetivo de compor conflitos oriundos da relação de consumo de forma eficiente.
Palavras-chave: Direito do consumidor; composição de conflitos;Política Pública; Iniciativa Privada
.
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988 institui como dever do Estado o exercício da função jurisdicional. Todavia, o Poder Judiciário atualmente se depara com uma demanda cada vez maior de conflitos, levando a um excesso de ações individuais, e trazendo como conseqüência a morosidade do Poder Judiciário.
Diante desse cenário, verifica-se a necessidade de que a sociedade civil una esforços com vistas a melhorar não somente a celeridade processual,mas, também, a economia de recursos públicos, criando mecanismos e soluções extrajudicias de conflitos.O emprego de meios tecnológicos tem demonstrado potencialidade para implementação de instrumentos para composição de conflitos em massa.
A redação do Código de Defesa do Consumidor foi clara em estabelecer os objetivos a serem buscados por meio de políticas públicas e pelos fornecedores nas relações de consumo, e , dentre eles, o art 4º, em especial, cuida da Política Nacional das Relações de Consumo tendo por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, e traz os objetivos a serem perseguidos pela política de proteção ao consumidor. Em seu inciso V está o incentivo à criação, pelos fornecedores, de meios eficientes de controle de qualidade e segurança de produtos e serviços, assim como de mecanismos alternativos de solução de conflitos de consumo.
Com o surgimento e a expansão global da internet tornam-se possíveis novas maneiras para resolver conflitos diretamente entre consumidor e fornecedor, prática na qual reduziria a excessiva demanda do judiciário e amenizaria o gasto da máquina pública com a intenção de aproximar da harmonia dos interesses na relação de consumo.
Nesse contexto, o presente estudo terá como fio condutor demonstrar a tendência de meios de composição de conflitos de iniciativa privada e política pública, utilizando método de resolução de conflitos em rede para atingir o objetivo.
- MEIOS DE COMPOSIÇÃO DE CONFLITOS
O texto atual da Constitucional da República Federativa do Brasil assegura que qualquer pessoa pode recorrer ao judiciário caso haja lesão ou ameaça a direito, sendo esta legitimação universal.[1]E é por meio do “acesso à justiça” que se identificam duas finalidades básicas do sistema jurídico, pelos quais as pessoas podem reivindicar seus direitos e/ou resolver seus litígios sob auspícios do Estado.Primeiro, o sistema deve ser igualmente acessível a todos; segundo, ele deve produzir resultados que sejam individual e socialmente justos[2].
Nesse raciocínio, Cappeletti e Garth, produziram interessante ensaio para o “Projeto de Florença”, identificando três grandes ondas renovatórias no processo evolutivo de acesso à ordem jurídica justa. A primeira onda teve início em 1965, concentrando-se na assistência judiciária. A segunda referia-se às ““… ““Reformas tendentes a proporcionar representação jurídica para os interesses difusos”, especialmente nas áreas de proteção ambiental e do consumidor”. O terceiro foi pelos autores chamados de “enfoque de acesso à justiça”, reproduzindo as experiências anteriores, mas indo além, buscando “… atacar as barreiras ao acesso de modo mais articulado e compreensivo”[3].
Todavia, a resolução formal de litígios particularmente nos tribunais é muito dispendiosa, haja vista que no ano de 2019 as despesas totais do Poder Judiciário somaram R$ 93,7 bilhões de reais[4]. Além do que, o excesso de demanda leva à morosidade[5] em todo o sistema, e conseqüentemente na constante insatisfação do jurisdicionado, a quem oferece uma prestação tardia e muitas vezes ineficaz[6].
A procura acentuada ao Poder Judiciário procede-se devido ao aumento populacional, a conscientização de parte dos cidadãos brasileiros, a ênfase que se deu na Constituição Brasileira de 1988 sobre os direitos das pessoas, a evolução tecnológica porque passa o mundo, tudo isto concorreu para a procura da justiça em uma escala bem maior[7].
Em relação ao tema, Christophe W. Moore comenta que: Todas as sociedades, comunidades, organizações e relacionamentos interpessoais experimentam conflitos em um ou outro momento no processo diário de interação. O conflito não é necessariamente ruim, anormal ou disfuncional, é um fato da vida[8].
A garantia constitucional do acesso à justiça é tão fundamental quanto assegurar a efetiva prestação jurisdicional, para a concretização do Estado democrático de Direito. Conforme se verifica, o Supremo Tribunal Federal, manifestou nesse sentido:
(…) de nada valeria a CF declarar com tanta pompa e circunstância o direito à razoável duração do processo (e, no caso, o direito à brevidade e excepcionalidade da internação preventiva), se a ele não correspondesse o direito estatal de julgar com presteza. Dever que é uma das vertentes da altissonante regra constitucional de que a “lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” (inciso XXXV do art. 5º). Dever, enfim, que, do ângulo do indivíduo, é constitutivo da tradicional garantia de acesso eficaz ao Poder Judiciário (“universalização da Justiça”, também se diz).[9]
A eficiência diz respeito ao grau de aproximação e à relação entre o previsto e realizado, no sentido de combinar os insumos e os implementos necessários à consecução dos resultados visados[10]. Em meio aos aspectos multifacetários que marcam as relações sociais atuais, é preciso buscar estratégias consensuadas de tratamento das demandas, não operando somente com a lógica do terceiro estranho às partes (juiz), mas buscando a instituição de outra cultura que trabalhe com a concepção de fomento à reconstituição autonomizada do litígio[11].
Em razão da crescente judicialização, a desjudicialização[12] dos conflitos tem sido um tema recorrente na pauta do Poder Judiciário, e por isso significativas alterações legislativas consolidam essa mudança, como a resolução n° 125 de 29/11/2010 do Conselho Nacional de Justiça(CNJ)[13].A Resolução n. 125 do CNJ, que instituiu a política judiciária nacional de tratamento adequado aos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário, tem objeto e objetivo bem definidos: consolidar uma política pública e permanente de aperfeiçoamento dos mecanismos consensuais de solução do litígio, entendendo que a mediação e a conciliação seriam instrumentos efetivos de pacificação e prevenção de litígios.[14]
Dentre as políticas implementadas pelo CNJ, o incentivo à adoção dos “Métodos Adequados de Solução de Conflitos”(MAScs), tais como mediação, conciliação, arbitragem .A promoção da solução consensual dos conflitos consagrou-se definitivamente com a edição do Novo Código de Processo Civil[15]e da nova Lei de Mediação[16] .
Frank Sander idealizou um modelo denominado Sistema de Multiportas, cujo objetivo central visa oferecer soluções mais congruentes às peculiaridades de cada demanda, de forma efetiva, célere e de custeio razoável.[17]. O paradigma do código, é que todas as ações judiciais, deverão antes de adentrar a via contenciosa, passar por uma audiência de conciliação e mediação, a fim de encontrar uma resolução ao conflito de interesses mais rápido e facilmente, economizando atos processuais e sendo efetivo às partes.[18]
Lilia Sales e Cilana de Morais Soares identificam a mediação, a conciliação e arbitragem[19] como práticas democráticas, uma vez que “são procedimentos que procuram resolver os conflitos de maneira ativa, participativa, pacífica e inclusiva, por meio da valorização do diálogo, do respeito às partes, da formação de parcerias e com ativa participação e responsabilidade das pessoas”[20]
Esse modelo diferenciado que propõe uma outra forma de tratar os conflitos, buscando não só uma solução para o poder Judiciário, cujo modelo de jurisdição encontra-se esgotado, mas também a autonomia das partes, possui, na pessoa do autocompositor, o ponto de equilíbrio capaz de levar as partes a encontrarem um acordo mutuamente satisfatório do qual ambas não se arrependerão.[21]Grandes autores defendem que os “métodos alternativos de resolução de conflitos não constituem “formas alternativas” de composição de conflito, mas sim meios adequados para esse fim[22] .
O acesso à justiça deve ser entendido não só como acesso aos tribunais, mas também como acesso ao exercício pacífico e pleno dos direitos e, em especial, dos direitos fundamentais, bem como às diversas alternativas para a resolução pacífica dos conflitos sociais.[23]Não se trata apenas de possibilitar o acesso à justiça enquanto instituição estatal, e sim viabilizar o acesso à jurídica justa.”[24]
- POLÍTICAS PÚBLICAS PARA COMPOR CONFLITOS EM BENEFÍCIO AOS CONSUMIDORES
Os litígios derivados de conflitos de consumo apresentam-se como grandes vilões do abarrotamento de ações judiciais nas varas e tribunais brasileiros. Só no ano de 2019 foram contabilizadas 1.554.376 (um milhão quinhentos e cinquenta e quatro mil e trezentos e setenta e seis) de ações relacionadas ao direito do consumidor, o que corresponde a (3,74%) das ações judiciais em trâmite no primeiro grau Justiça Estadual, além de representar 12,41% dos assuntos mais demandados nos juizados especiais[25].
A defesa do consumidor no Brasil é reflexo do emblemático discurso do presidente americano John F. Kennedy, em 15 de março de 1962[26] que promoveu a pauta de defesa do consumidor; no ano de 1985 a ONU reconhece a legitimidade internacional do tema ao publicar a diretrizes de defesa do consumidor[27], eis o espírito que contempla a redação da Constituição Federal de 1988, que insere na ordem dos direitos e garantias fundamentais a defesa do consumidor, elencando-o também como princípio da ordem econômica nacional.[28]
Em síntese, o Código Defesa do Consumidor nasce como a primeira política pública de defesa do consumidor do Brasil, regulamentando o tema ao criar norma de ordem pública e interesse social no intuito de promover a proteção e defesa, consolidando o dever de proteção, imposto constitucionalmente ao Estado[29]. O código de Defesa do Consumidor identificou este sujeito de direitos, o consumidor, e ter construído um sistema de normas e princípios orgânicos para protegê-lo e efetivar seus direitos, que no caso brasileiro, trata-se da realização de um direito fundamental (positivo) de proteção do Estado.[30]
A efetividade, é elemento basilar do CDC já na idéia principiológica e fundamental da Política Nacional das Relações de Consumo, relacionando a efetividade à dignidade do consumidor, à proteção de seus interesses econômicos, à melhoria da sua qualidade de vida, bem como à transparência e à harmonia das relações de consumo[31]. Em especial, o art.4 do CDC cuida da Política Nacional das Relações de Consumo, tendo por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo.
Segundo o Professor Eros Roberto Grau, as normas enumeradas no art.4º são consideradas “normas objetivos”, possuindo um papel fundamental, uma vez que condicionam a interpretação feita pelo código. Uma vez que o artigo enumera objetivos a serem perseguidos, seja através de políticas públicas, seja através da atuação do fornecedor e do próprio consumidor, e também princípios a serem aplicados, as demais normas devem ser interpretadas finalisticamente, visando a busca dos objetivos[32].
O art. 5°, CDC, trouxe a previsão de que para a execução da Política Nacional das Relações de Consumo, contará o poder público com os seguintes instrumentos, entre outros: manutenção de assistência jurídica, integral e gratuita para o consumidor carente; instituição de Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor, no âmbito do Ministério Público; criação de delegacias de polícia especializadas no atendimento de consumidores vítimas de infrações penais de consumo; criação de Juizados Especiais e Varas Especializadas para a solução de litígios de consumo; e a concessão de estímulos à criação e desenvolvimento das Associações de Defesa do Consumidor.
O Código de Defesa do Consumidor ao elencar os direitos básicos trouxe, entre eles, o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurando a proteção Jurídica, administrativa e técnica. Nota-se o sentido de acesso à justiça não restrito ao acesso ao judiciário.[33]Os princípios contemplados que devem ser buscados através de políticas públicas pelos fornecedores na relação de consumo. Adequada, para os fins deste estudo, a conceituação de política pública como a “coordenação dos meios à disposição do Estado, harmonizando as atividades estatais e privadas para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente determinados”[34]
Contemporaneamente, sobressai em meio às iniciativas do Conselho a valorização do uso das novas tecnologias em todas as esferas de atuação da função jurisdicional. Num contexto de transformações da sociabilidade geradas por inovações tecnológicas e pelo intenso uso de comunicação em tempo real, percebeu-se a necessidade de reavaliação das formas atuais de solução de conflitos e de sua atualização para se adequarem à realidade contemporânea. A quase onipresença das comunicações em rede mediada pelos dispositivos móveis como smartphones e tablets repercutem diretamente na forma como as pessoas se comunicam, interagem, fazem negócios e convivem.[35]
Como meio de política pública, a Secretaria Nacional do Consumidor em 2014 lançou a plataforma [consumidor.gov.br],[36] que consiste em um método de resolução de conflitos em rede, forma de solução de conflitos que ocorre totalmente no ciberespaço.[37]A plataforma é um serviço público e gratuito que permite a interlocução direta entre consumidores e empresas para solução alternativa de conflitos de consumo pela internet, que possui como objetivo a comunicação do consumidor diretamente com o fornecedor,[38] gerando economia financeira e de tempo, a conveniência do procedimento, os benefícios em comparação ao litígio e o controle das partes sobre o resultado, vantagem da Resolução de Conflitos em rede[39].
A plataforma não constitui um procedimento administrativo e não se confunde com o atendimento tradicional prestado pelos Órgãos de Defesa do Consumidor, e se dá sem prejuízo do acesso à justiça[40].O maior controle das partes sobre a tomada de decisão e a comunicação assíncrona,característica peculiar às ODRs, são aspectos únicos, que não se apresentam de forma tão pronunciada em nenhum outro MASC e representam potencial inigualável de mudança de cultura e empoderamento social para que os indivíduos passem a buscar a solução de seus conflitos por meio de procedimentos consensuais.
O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a desnecessidade de prévio cumprimento de requisitos desproporcionais ou inviabilizadores da submissão de pleito ao Poder Judiciário, pois são métodos alternativos, mas não obrigatório, permanecendo o acesso à justiça resguardado para todos os que venham a ajuizar demanda diretamente ao órgão judiciário competente[41].
A plataforma funciona como um diálogo entre envio de reclamação proposta e contraproposta por meio da plataforma. De forma que o consumidor pode apresentar reclamação, que deve ser analisada e respondida pelo fornecedor interessado em até 10 (dez) dias.[42]
Conforme o último balanço realizado pela SENACON em parceria com o Ministério da Justiça e Segurança Pública, no ano de 2019 a plataforma possuía 1,7 milhões de reclamações, 1,2 milhões de usuários cadastrados, e 494 empresas cadastradas[43]. No ano de 2018 a plataforma finalizou 609 mil reclamações ,sendo que 99,3 % reclamações foram respondidas no prazo médio de 6,5 dias obtendo 81% solução. Entre os segmentos mais reclamados em 2018 estão as Operadoras de Telecomunicações( Telefonia, Internet, TV por assinatura) que possuem 40,3% das reclamações geradas na plataforma, 89,9% obtiveram solução.[44]
Por não se tratar de procedimento administrativo, o SNDC não realiza análise de mérito das demandas (no contexto de negociação assistida). Sua participação é restrita à hipótese em que o fornecedor solicita a recusa de registro de uma reclamação, situação em que o órgão de monitoramento, num prazo de 15 (quinze) dias, verifica se referido pedido é ou não procedente. Durante esse período, os 10 (dez) dias de que o fornecedor dispõe para análise da reclamação fica suspenso, sendo sua contagem reiniciada, apenas pelo tempo restante, após o posicionamento do SNDC. Em 2019[45], verificou-se que 74,9% dos consumidores consideram ruim a divulgação da plataforma consumidor.gov e não sabem de todos os serviços oferecidos no site.
A consumidor.gov.br mostra-se como um meio eficaz,demonstrando uma potencialidade para resolução de conflito em massa, porém nota-se a falta de políticas que levam à todos os possíveis usuários o conhecimento da plataforma, bem como as utilidades por ela oferecida[46].
Importante demonstrar o exemplo da Mercado Livre, uma plataforma de comércio online que possui a política aplicada à resolução de conflitos em rede que no último ano de 2018, vendeu via internet, cerca de 337 milhões de produtos. A empresa criou um projeto, denominado Empodera, que surgiu em 2017 pelo jurídico da companhia. A análise mostrou que 40% dos usuários que propunham uma ação judicial não tinham realizado qualquer tipo de contato anterior com a empresa, entretanto foi observado que os temas poderiam ter sido solucionados de forma prévia e consensualmente.[47]O Diretor RucardiKagrecamDuretir Jurídico Sênior do Mercadolivre no Brasil afirma que:
O Empodera foi criado com a intenção de dar maior autonomia e poder aos usuários do site para que – a partir de ferramentas simples, gratuitas e já disponíveis na plataforma – possam solucionar suas demandas com mais rapidez e eficácia e de forma muito mais sustentável, já que não exige o deslocamento de pessoas, por exemplo” Dalmaso Marques, ainda destaca que, “Logo nos primeiros meses, menos de 1% dos casos levados aos canais oferecidos foram judicializados posteriormente[48]
A primeira iniciativa é chamada de “Compra Garantida”.“Se o comprador utilizou o Mercado Pago (meio de pagamento do Mercado Livre), cumpriu os requisitos e fez a reclamação dentro do tempo propício,nós devolvemos o dinheiro a despeito da responsabilidade ou não do vendedor”, contou Ricardo Marques, gerente jurídico sênior do Mercado Livre.Sete em cada dez reclamações recebidas são resolvidas em uma dessas etapas. “A ODR pode levar a uma fidelização do consumidor. Existem benefícios de custo, eficiência, ecológicos, pois, ninguém se desloca para uma audiência. A resolução online de disputa faz sentido especialmente para as demandas de consumo, que geralmente são mais simples e podem ser resolvidas sem o Judiciário”.Para levar ao conhecimento dos usuários, a Mercado Livre produziu um vídeo com linguagem bastante atual e moderna que mostra os caminhos para a abertura de uma reclamação ou mediação no site. O caminhoinicial é o contato com o vendedor do produto, e caso o vendedor não resolva, o usuário pode entrar em contato com a própria plataforma na qual possui uma equipe que faz o meio de campo entre o consumidor e vendedor e busca apresentar a melhor solução.[49]
Os métodos de resolução de disputas on-line destacam sua maior simplicidade e confiabilidade, que não se destinam à aplicação em toda e qualquer disputa, mas preferencialmente àquelas que tenham grande recorrência e envolvem pequenos valores, de modo a permitir um modo menos custoso do que o oferecido pelas cortes judiciais. Da mesma forma, a um maior empoderamento dos consumidores corresponderia, para os fornecedores, ganhos de reputação com a adoção desses métodos.[50]Nesse particular, necessita-se de uma visão ampla e voltada para o futuro, o qual já se faz presente, com a virada para o terceiro milênio, é que poderão emergir deste novo contexto experiências e resultados absolutamente positivos, ao encontro dos interesses dos consumidores do direito, além de fazer renascer a crença no Judiciário e no ideal de justiça, o que se coaduna perfeitamente com a prestação de tutela por intermédio da jurisdição privada ao lado da jurisdição estatal em sintonia com ela.[51]
Para Tapscott e Williams, as empresas inteligentes trarão esses clientes para suas redes de negócios e lhes atribuirão papéis de liderança no desenvolvimento da próxima geração de produtos e serviços. Isso pode significar ajustar os modelos de negócios e renovar os processos internos, a fim de permitir uma melhor colaboração com os usuários.[52]O novo consumidor é um indivíduo politizado, bem informado e ético. Ele não só exige qualidade e preço justo dos produtos e serviços que consome, como também demanda interações mais éticas nas relações de consumo e nos relacionamentos de que faz parte e reclama que cada organização cumpra devidamente seu papel na sociedade.[53]
Os métodos de solução de conflitos, já se provaram instrumentos fortes para pacificação social, na medida em que, se frutíferos,resultam em uma solução criada, discutida e acordada entre as partes envolvidas. Nesse sentido, trabalha-se para que se solucione os problemas vislumbrados na prestação jurisdicional moderna, entretanto há potencial para alcançar além: um Estado onde o Poder Público, as empresas e os indivíduos aprendam a solucionar seus conflitos entre si,dialogando em direção à paz.[54]
Ao mesmo tempo em que novas tecnologias tornaram determinante o jogo de poder do mercado, possibilitam igualmente a convergência de vozes e conseqüentemente abriram-se portas para meios resolução de conflitos, principalmente as plataformas de composição de conflitos em rede.
CONCLUSÃO
As pesquisas apontam números exorbitantes de litígios oriundos da relação de consumo, que tramitam ou já tramitaram nas varas e juizados do Poder Judiciário Brasileiro. Diante dessas circunstâncias a busca por outros meios de composição torna-se prioridade para garantir que seja cumprido o verdadeiro ideal de justiça.
A promoção de meios de solução de controvérsias demonstra-se democrática, pois valoriza o diálogo entre as partes que buscam de forma amigável resolver o problema, harmonizando a relação de consumo. Surgem daí os meios de Resolução de Conflitos em rede, que vêm se demonstrando uma ferramenta eficiente e idônea para resolução de controvérsias, pois facilitam a comunicação entre as partes aproximando o consumidor e o fornecedor.
Entretanto, são necessárias políticas de publicidade para que os meios de composição de conflitos em rede, como a plataforma consumidor.gov.br passem a ser de amplo conhecimento da sociedade e, possa lograr o êxito esperado quando da sua criação. Torna-se oportuno espelhar em práticas que já foram aplicadas por empresas privadas, que obtiveram resultados frutíferos, levando em consideração inclusive o aumento da credibilidade da empresa, bem como a redução considerável de litígios levados ao Poder Judiciário.
REFERÊNCIAS
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[1] CF/88 art. 5º, inciso XXXV.
[2]CAPPELLETTI,Mauro;GARTH, Bryant. Acesso à justiça, 1988.p.8.
[3]CAPPELLETTI,Mauro;GARTH, Bryant. Acesso à justiça, 1988. p.31.
[4] Justiça em números 2019.
[5] Segundo Feitosa, o crescimento da demanda judicial é um dos principais fatores que contribuem para o agravamento da morosidade processual.
[6] RAMOS, Fabiana D´Andrea Ramos. Métodos Autocompositivos e Respeito à Vulnerabilidade do Consumidor
[7] FEITOSA, 2007, p. 31.
[8] MOORE, Christopher W. O processo de mediação: estratégias práticas para a resolução de conflitos. Tradução Magda França Lopes. 2.ed. Porto Alegre: Artmed, 1998. p. 5
[9]HC 94.000, voto do rel. min. Ayres Britto, j. 17-6-2008, 1ª T, DJE de 13-3-2009.
[10] Para Belloni, Magalhães e Sousa (2001, p. 62)
[11]A “JURISCONSTRUÇÃO” DE UMA RESPOSTA PARA OS CONFLITOS SOCIAIS A PARTIR DAS “ALTERNATIVE DISPUTE RESOLUTION” (ADR) NO BRASIL- Fabiana Marion Spengler.
[12]Importante destacar entendimento da Professora Fabiana D’ Andrea Ramos um artigo publicado no CONJUR; “a introdução de novas formas de tratamento dos conflitos, sobretudo por meio de métodos autocompositivos, não tem como função a redução de ações judiciais. A desjudicialização não é a causa, mas uma das consequências da existência de métodos extrajudiciais. A necessidade de se criar e, sobretudo, legitimar novas formas de solução dos conflitos nasce a partir do reconhecimento de que nem todo conflito precisa se transformar em litígio, posto que a via litigiosa não é sempre a mais adequada. A valorização dos métodos autocompositivos surge, portanto, a partir da percepção de que a noção de justiça pressupõe um tratamento adequado do conflito e tratamento adequado significa oferecer para cada tipo de conflito a melhor via para solução. O papel do Poder Judiciário hoje, portanto, é oferecer uma estrutura em que se possa identificar, para cada tipo de conflito, o tratamento mais apropriado, seja por meio de uma ação judicial, ou por outros métodos, tais como a conciliação ou mediação. A via da conciliação já foi apresentada há muito tempo para solução dos conflitos de consumo, por meio da instituição dos juizados especiais cíveis e, infelizmente, fracassou. Hoje, a mediação surge como opção favorita, mas o fato é que na maior parte das vezes não se apresenta como o método mais eficiente para solução dos conflitos de consumo, para os quais em geral é suficiente trabalhar as posições, e não necessariamente os interesses dos envolvidos (…) surge uma terceira questão importante, que diz respeito ao interesse público na proteção do consumidor. No caso particular da mediação, é fato que ela pode se apresentar como via apropriada para solução de certos conflitos de consumo, especialmente aqueles nos quais se pretende restabelecer a relação de confiança entre consumidor e fornecedor, quando é importante o acolhimento de aspectos emocionais. Em outra oportunidade já defendemos inclusive que nos casos de acidentes de consumo, por exemplo, a mediação pode mesmo contribuir para o fortalecimento da autonomia do consumidor e para a redução da sua vulnerabilidade. RAMOS, Fabiana D’Andrea. A desjudicialização favorece o consumidor? Disponível em: https://www.conjur.com.br/2018-jan-17/garantias-consumo-desjudicializacao-favorece-protecao-consumidor
[13] O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), é responsável pelo controle administrativo do Poder Judiciário e pelo planejamento de políticas públicas para o Sistema de Justiça, na qual criou-se a Política Judiciária Nacional de tratamento dos conflitos de interesses, como objetivo de assegurar a todos o direito à solução dos conflitos por meios adequados à sua natureza e peculiaridade. .
[14] Resolução n. 125 do CNJ
[15]( Lei n°13.105, de 16.03.2015)
[16].(Lei n° 13.140, de 26.06.2015).
[17] Em entrevista à professora Mariana Hernandez Crespo, o professor Frank Sander, explicou que o nome inicial dado por ele a esta ideia foi comprehensive justice center, contudo, como a ABA – American Bar Association, já havia publicado matéria sobre o assunto denominando-a como multi-doorcourthouse, e por ser esta nomenclatura menos acadêmica e mais popular, consequentemente, foi mais disseminada e a adotada pelo autor da ideia.
[18] THEODORO JUNIOR, 2016.
[19]Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996): constitucionalidade, em tese, do juízo arbitral; discussão incidental da constitucionalidade de vários dos tópicos da nova lei, especialmente acerca da compatibilidade, ou não, entre a execução judicial específica para a solução de futuros conflitos da cláusula compromissória e a garantia constitucional da universalidade da jurisdição do Poder Judiciário (CF, art. 5º, XXXV). Constitucionalidade declarada pelo Plenário, considerando o Tribunal, por maioria de votos, que a manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória, quando da celebração do contrato, e a permissão legal dada ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar o compromisso não ofendem o art. 5º, XXXV, da CF.
[SE 5.206 AgR, rel. min. Sepúlveda Pertence, j. 12-12-2001, P, DJ de 30-4-2004.]
[20], Lilia Maia de Morais; RABELO, Cilana de Morais Soares. Meios consensuais de solução de conflitos: Instrumentos de democracia. Revista de informação legislativa : v. 46, n. 182 (abr./jun. 2009),p.86./ [http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/194916] acesso em 19.04.2020
[21]SpenglerF., &SpenglerNetoT. (2011). A Possibilidade do Tratamento de Conflitos no Âmbito do Judiciário por Meio da Teoria dos Jogos.
[22] Petrônio Calmon. Fundamentos da mediação e da conciliação, p22
[23]DOS SANTOS, Denise Tanaka. Efetividade e interpretação das “100 Regras de Brasília”, p. 3.
[24]K. Watanabe. Acesso à justiça e sociedade moderna, in A.P Grinover( coord), Participação e Processo, p. 128
[25] Justiça em números 2019.
[26] (PUBLIC PAPERS OF THE PRESIDENTS, p. 235, apud, SODRÉ, 2007, p. 22)
[27] (MORSE, 1993, p. 218 apud SODRÉ, 2007, p. 89),
[28] “Art. 5º, XXXII – o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor e Art. 170, V, CF – A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios (…) defesa do consumidor”.
[29]CARVALHO, Diógenes Faria de; BAMBIRRA, Felipe Magalhães; FERREIRA, Vitor Hugo do Amaral. Política Nacional de Defesa do Consumidor: apontamentos necessários entre as bases de proteção e os mecanismos de resolução de conflito. Revista de Direito do Consumidor. vol. 128. ano 29. p. 17-53. São Paulo: Ed. RT, mar.-abr./2020.
[30]MARQUES; BENJAMIN; MIRAGEM, 2016, p. 78.
[31] Artigo: Onde está a Politica de defesa do consumidor- Vitor Hugo do Amaral Ferreira
[32]Grau. Eros Roberto. Interpretando o Codigo de Defesa do Consumidor. Revista de Direito do Consumidor. Vol.5, RT,pg.166.
[33]CARVALHO, Diógenes Faria de; BAMBIRRA, Felipe Magalhães; FERREIRA, Vitor Hugo do Amaral. Política Nacional de Defesa do Consumidor: apontamentos necessários entre as bases de proteção e os mecanismos de resolução de conflito. Revista de Direito do Consumidor. vol. 128. ano 29. p. 17-53. São Paulo: Ed. RT, mar.-abr./2020.
[34] (BARCELLOS, 2008, p. 112).
[35] Revista do Direito [ISSN 1982-9957]. Santa Cruz do Sul, v. 3, n. 50, p. 53-70, set./dez. 2016.
[36] Disponível em: [ https://consumidor.gov.br/pages/principal/?1595197827933]. Acesso em: 19.07.20.
[37] (GOODMAN, 2003; KATSH; RIFKIN, 2001; RULE, 2002)
[38] [Consumidor.gov.br]
[39]Cortés (2011)
[40] [Consumidor.gov.br]
[41]O Supremo Tribunal Federal tem reconhecido, em obediência ao inc. XXXV do art. 5º da Constituição da República, a desnecessidade de prévio cumprimento de requisitos desproporcionais ou inviabilizadores da submissão de pleito ao Poder Judiciário. Contraria a Constituição interpretação do previsto no art. 625-D e parágrafos da Consolidação das Leis do Trabalho pelo qual se reconhecesse a submissão da pretensão à Comissão de Conciliação Prévia como requisito para ajuizamento de reclamação trabalhista. Interpretação conforme a Constituição da norma. Art. 625-D e parágrafos da Consolidação das Leis do Trabalhos: a legitimidade desse meio alternativo de resolução de conflitos baseia-se na consensualidade, sendo importante instrumento para o acesso à ordem jurídica justa, devendo ser estimulada, não consubstanciando, todavia, requisito essencial para o ajuizamento de reclamações trabalhistas. Ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente para dar interpretação conforme a Constituição aos §§ 1º a 4º do art. 625-D da Consolidação das Leis do Trabalho, no sentido de assentar que a Comissão de Conciliação Prévia constitui meio legítimo, mas não obrigatório de solução de conflitos, permanecendo o acesso à justiça resguardado para todos os que venham a ajuizar demanda diretamente ao órgão judiciário competente.[ADI 2.139 e ADI 2.160, rel. min. Cármen Lúcia, j. 1º-8-2018, P, DJE de 19-2-2019.]
[42] Consumidor.gov.br
[43] Balanço Consumidor.gov.br Números Gerais da Plataforma
[44] Balanço Consumidor.gov.br Reclamações de consumo em 2018
[45] Foram obtidas 2.030 respostas, entre o período 2 a 30 de setembro de 2019.
[46] O Superior tribunal de Justiça recentemente reconheceu a potencialidade do uso de plataformas tecnológicas para solução de conflitos em massa, recomendando ao Poder Público, o Poder Judiciário, as agências reguladoras e a sociedade civil a estimularem a adoção de medidas concretas o uso dessas plataformas. I JORNADA DE PREVENÇÃO E SOLUÇÃO EXTRAJUDICIAL DE LITÍGIOS 2018.
[47] Disponível em:[https://www.startse.com/noticia/nova-economia/mercado-livre-odr-resolucao-conflito].
Acesso em : 22.06.2020
[48] Disponível em :[https://www.clientesa.com.br/gestao/67258/longe-dos-tribunais/ler.aspx]. Acesso em 19.07.20.
[49]Disponível em:[https://www.startse.com/noticia/nova-economia/mercado-livre-odr-resolucao-conflito].
Acesso em : 22.06.2020
[50] Miragem, Bruno. Novo paradigma tecnológico, mercado de consumo digital e o direito do consumidor. Revista de Direito do Consumidor. vol. 125. ano 28. p. 17-62. São Paulo: Ed. RT, set.-out./2019.
[51] (FIGUEIRA JÚNIOR, 1999, p. 16).
[52] (2007, p. 171)
[53] Samara e Morsch (2005, p. 244)
[54] ADOÇÃO DE SOLUÇÕES EM ONLINE DISPUTE RESOLUTION COMO POLÍTICA PÚBLICA PARA O PODER JUDICIÁRIO: UM PANORAMA DA SITUAÇÃO BRASILEIRA Gabriela Vasconcelos Lima.